JUSTIÇA AUTORIZA CÁLCULO DE ITBI PELO VALOR PAGO EM LEILÃO DE BEM

Quem adquiriu imóveis por meio de leilão judicial tem conseguido na justiça decisões para recolher o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) de acordo com o montante pago na hasta pública e não sobre o valor venal do bem, como cobrado por algumas prefeituras.

A medida pode representar grande
economia para o contribuinte, pois imóveis leiloados são normalmente adquiridos
por valores mais baixos. Em caso analisado recentemente pelo Tribunal de
Justiça de São Paulo (TJ-SP) um imóvel com valor venal de R$ 30 milhões foi
arrematado por R$ 5,9 milhões. As alíquotas cobradas de ITBI variam entre os
municípios, em São Paulo e Brasília é de 3%, por exemplo. No Rio de Janeiro corresponde
a 2%.

O tema tem decisões favoráveis aos contribuintes em pelo menos dez tribunais de Justiça (São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Distrito federal, Rio Grande do Sul, Paraná, Sergipe, Alagoas, Ceará e Mato Grosso), segundo pesquisa do escritório de advocacia Sigaud Advogados. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) também tem julgamentos recentes no mesmo sentido.

O advogado Bruno Sigaud, do escritório que leva seu sobrenome, afirma que a discussão é relevante porque, em razão da crise econômica dos últimos anos, diversas empresas e pessoas físicas tiveram bens penhorados judicialmente para quitar dívidas. Nesse sentido, grande parcela das aquisições imobiliárias passou a ser realizada por meio de leilões judiciais, segundo ele. Nos últimos três anos, por exemplo, 184 imóveis foram leiloados pelo TJ-SP.

O mercado de leilões de imóveis tem
sido usado cada vez mais como forma de investimento, segundo o advogado da área
imobiliária Luis Rodrigo Almeida, do Viseu Advogados. “A procura de clientes
que me consultam sobre o tema está impressionante”, afirma.

No leilão, um leiloeiro anuncia o
bem imóvel e o arrematante que der o maior lance, faz a aquisição. Ao registrar
o imóvel, o cartório exige o ITBI sobre a base de cálculo do valor venal do
imóvel ou do valor de avaliação para o leilão, conforme estabelecer a lei do
município. Neste momento, os contribuintes têm entrado com pedidos de liminares
para pagar o ITBI com base no valor arrematado do imóvel e somente no seu
registro.

Segundo Sigaud, como o valor de
aquisição representa o efetivo valor de mercado do imóvel, o ITBI deveria ser
obrigatoriamente recolhido sobre o valor de arrematação. Diversos municípios,
porém, exigem o ITBI sobre bases distintas do valor de arremate ainda no
momento do registro de arrematação. “Neste momento, os contribuintes devem
entrar na Justiça para recolher o ITBI sobre o valor do arremate e somente na
hora do registro do imóvel, sem pagamento de multas e juros, apenas de
atualização”, diz.

De acordo com o advogado, o mesmo raciocínio tem sido usado para leilões extrajudiciais, nos casos em que os
bancos leiloam imóvel que foi financiado e não quitado. “Nesses casos a
jurisprudência é um pouco menos pacífica, mas temos alguns julgados favoráveis,
até mesmo no STJ”, diz. Entre eles, está o Recurso Especial nº 1.803.169.

As diferenças de valores pagas de
ITBI podem ser significativas. Em um caso julgado em janeiro pela 18ª Câmara de
Direito Público do TJ-SP, o município de Caieiras (SP) cobra o ITBI pelo valor
venal de imóvel de R$ 30, 9 milhões. Contudo, o bem foi arrematado por R$ 5,7
milhões por um empreendimento imobiliário. Os desembargadores mantiveram
sentença que determinou o valor de arrematação como fato gerador de ITBI, que
deve ser recolhido somente no registro do imóvel.

O município de Caieiras alegou no
recurso ao tribunal que a base de cálculo do ITBI é o valor venal, com
fundamentação da Lei Complementar nº 5.118, de 2018. Segundo a defesa, “a
utilização do preço pago em arrematação em leilão extrajudicial como base de cálculo
do ITBI, considerando que a absoluta necessidade de venda pública do bem
provoca sensível queda no seu valor, que então não representa, de forma alguma,
o verdadeiro valor venal do imóvel”.

Ao analisar o caso
(apelação/remessa necessária nº 1001783-22.2019.8.26.0106), o relator,
desembargador Ricardo Chimenti, entendeu que apesar do artigo 38 do Código
Tributário Nacional (CTN) estabelecer que a base de cálculo do ITBI é o valor venal
dos bens, ao tratar da aquisição de bens levados em hasta pública, o STJ diz que
incide sobre o valor de arrematação.

As três câmaras que julgam o assunto no TJ-SP (14ª, 15ª e 18ª) possuem entendimento consolidado a favor dos contribuintes, segundo Bruno Sigaud. Recentemente, a 2ª Turma do STJ
confirmou decisão do TJ-SP contra o município de São Paulo. Segundo o relator,
ministro Herman Benjamin, o entendimento do tribunal está de acordo com o do
STJ de que, no caso de hasta pública, o valor venal corresponde ao valor
arrematado, para fins de cálculo do ITBI (processo 1.542.296).

Já no Tribunal de Justiça do Ceará
(TJ-CE), o desembargador Luiz Evaldo Gonçalves Leite, confirmou o direito de um
empreendimento imobiliário de recolher o ITBI com base no valor de um imóvel
arrematado em Fortaleza por R$ 3,6 milhões – sobre o valor deve incidir a
alíquota de 2%, que corresponderá a R$ 72,8 mil. Segundo a decisão do
desembargador (processo 0187419-70.2013.8.06.0001), “tratando-se de imóvel
arrematado judicialmente, é pacífico o entendimento de que deve ser considerado
como valor venal do imóvel, para fins de definição da base de cálculo, o valor
alcançado em hasta pública (de arrematação)”.

O advogado tributarista Carlos
Navarro, do Viseu Advogados, afirma que esse tema é uma nova vertente de uma
antiga disputa que tratou do valor de mercado (VVR) ou valor da transação. Isso
porque as vezes os imóveis são vendidos bem abaixo do mercado, o que vem
gerando precedentes favoráveis aos contribuintes. Para Navarro, essas decisões
são acertadas, e caso o VVR supere o valor de transação, este último é que deve
ser usado como base de cálculo.

A única ressalva que o advogado faz está nas situações em que existem eventuais dívidas que seriam quitadas pelo arrematante. “Em casos como esses, entendo que o valor de mercado do bem seria equivalente ao valor de arrematação mais o valor das dívidas”, afirma.

Fonte: Valor Econômico – Por: Adriana Aguiar