TJ-SP livra sócios de cobranças com base na MP da Liberdade Econômica

O Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJ-SP) começou a aplicar os requisitos previstos pela Medida Provisória da
Liberdade Econômica (MP nº 881) para definir se sócios e administradores devem
responder por dívidas de empresas. Em alguns casos, com base nas mudanças, os
desembargadores têm livrado empresários do redirecionamento das cobranças.

A MP, segundo justificativa do
governo, foi editada para consolidar na lei a jurisprudência já firmada no
Superior Tribunal de Justiça (STJ), que muitas vezes não é aplicada nas instâncias
inferiores. Foram incluídos no artigo 50 do Código Civil critérios objetivos de
quando pode haver a responsabilização de sócios e administradores.

Pelo texto da Medida Provisória, só
poderão responder nos casos em que houver desvio de finalidade, ou seja, quando
utilizarem a empresa com o propósito de lesar credores e para a prática de atos
ilícitos de qualquer natureza. Ou nos casos de confusão patrimonial, que seria
a ausência de separação de fato entre os patrimônios, o que ficou melhor
caracterizado com a MP.

Uma das decisões beneficia sócios
de uma imobiliária, em uma disputa com um escritório de contabilidade (agravo
de instrumento nº2243292-27.2017.8.26. 0000). Por unanimidade, os
desembargadores da 28ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça
paulista entenderam que não cabia a responsabilização dos empresários.

A relatora do caso, desembargadora
Berenice Marcondes Cesar, destaca, em seu voto, que a chamada desconsideração
da personalidade jurídica “é medida bastante extrema e excepcional”.
Para ela, “não basta mera irregularidade para dar ensejo à medida”.
Deve haver, segundo a magistrada, prova cabal da existência dos requisitos
previstos no artigo 50 do Código Civil.

Em seu voto, acrescenta que a MP 881,
que institui a Declaração de Direito de Liberdade Econômica, “promoveu
restrições ainda maiores à possibilidade de desconsideração da personalidade
jurídica”, que já vinham sendo confirmadas pela jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça.

No entendimento dela, o pedido não
se encaixava nas hipóteses por tratar apenas de “inadimplemento
obrigacional, ausência de bens passíveis de penhora e falta de apresentação de
embargos à execução nos autos”.

Em outro caso, também analisado
pela 28ª Câmara de Direito Privado, os desembargadores foram unânimes ao negar
a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar empresas que
supostamente seriam de um mesmo grupo econômico. O pedido partiu de uma empresa
de engenharia contra uma empresa de construções e uma incorporadora e seus
sócios.

A alegação era a de que a empresa
de construções esconde seu patrimônio em outras do mesmo grupo econômico, está
inadimplente e sob virtual encerramento irregular de suas atividades. Os
motivos, porém, segundo afirma a relatora, desembargadora Berenice Marcondes
Cesar, não estariam elencados na nova redação do artigo 50 (agravo de
instrumento nº 2238419-81.2017.8.26.0000).

Há decisões, porém, que reconhecem
no caso os requisitos previstos na nova MP. A 23ª Câmara de Direito Privado do
TJ-SP, por unanimidade, negou provimento ao recurso de uma empresa que alegava
não fazer parte de um grupo econômico de ferragens e esquadrias (agravo de
instrumento nº 2062453-36.2019.8.26.0000).

O desembargador José Marcos
Marrone, com base no artigo 50, considerou que haveria provas da confusão
patrimonial entre as empresas, que justificam a desconsideração da
personalidade jurídica. “Ora, causa estranheza o fato de que, embora as
mencionadas empresas sejam administradas por sócios em comum, exerçam
atividades no mesmo endereço, atuem em igual segmento de mercado, apenas uma
delas possua ativos financeiros e as outras não”, diz.

Marrone acrescenta, em seu voto,
que “tais circunstâncias, dentre outras, levam à conclusão de que as
ventiladas empresas, efetivamente, formam um grupo econômico, havendo de se
reconhecer abuso de personalidade, caracterizado pela confusão
patrimonial”.

Para o advogado Luis Cascaldi,
sócio do Martinelli Advocacia Empresarial, as decisões que aplicam a MP dão
maior transparência e segurança para esses processos. O novo texto do artigo 50
do Código Civil, acrescenta, diminui a margem de interpretação sobre o que são
desvio de finalidade e confusão patrimonial. “Agora temos diretrizes mais
objetivas para tratar do instituto da desconsideração da personalidade
jurídica, que é uma medida a ser adotada somente em casos excepcionais”,
afirma.

O advogado Helder Moroni Câmara, do
PMMF Advogados, entende que agora as regras estão mais claras para todos. A
possibilidade de haver a desconsideração da personalidade jurídica, acrescenta,
incentiva o pagamento da dívida. “Sempre que a regra do jogo é mais clara,
é mais justo”, diz.

A tributarista Tatiana Chiaradia, do Candido Martins Advogados, afirma que a MP também poderá ser aplicada em casos que tratam de dívida tributária, envolvendo grupo econômico, uma vez que a fundamentação desses pedidos tem como base o artigo 50 do Código Civil. Com o novo texto, que consolidou o entendimento do STJ, ela acredita que haverá uma quantidade menor de bloqueios indevidos de contas bancárias por juízes de primeira instância, que agora terão que seguir os novos dispositivos.

Fonte: Por Adriana Aguiar – Valor Econômico